26 de set. de 2007

O fato "tropa de elite"



Muito se fala ainda sobre o fato "Tropa de Elite", que alimenta a profícua discussão sobre propriedade intelectual - o síto Cinética (recomendado) também trata do assunto. De minha parte, percebo que se ignora, inclusive no bom texto de Cezar Migliorin constante no sítio citado e linkado, um outro aspecto interessante da questão da propriedade intelectual, do direito autoral e do acesso ao conhecimento - qual seja: o financiamento público de produtos autorais.


O filme Tropa de elite foi viabilizado através da Lei Rouanet (cuja reforma - não acontecida - é pauta do programa do PT desde a eleição de 2002). Ou seja, o filme foi produzido, em última instância, com dinheiro público, via renúncia fiscal. Isso torna a questão bem mais delicada! O diretor José Padilha reclama, com alguma razão, da publicação de sua obra inacabada. Certo. Mas a pirataria, por outro lado, além de fazer cumprir (por linhas tortas?) o objetivo de tornar acessível ao povão um bem imaterial (a experiência do filme) que pertence a todos, também devolve a este povão o investimento público que poderia vir na forma de uma escola, de saneamento básico (sem ser o filme), enfim, de infra-estrutura básica tão necessária - e acabou vindo na forma de um filme, tão necessário quanto a escola e o saneamento básico, julgo eu.

Que uma grande produtora cinematográfica privada criminalize o cara que compra um dvd pirata, ainda que questionável, é uma atitude compreensível - seus lucros advém das bilheterias e da venda legal dos produtos, há toda uma estrutura e lógica de mercado que a sustenta. Mas quando o filme chega pago aos cinemas - e com dinheiro público - o que pensar?

Penso, primeiro, que é bom o povão se interesse em assistir um filme como Tropa de elite! E depois, é hora de sacudir as estruturas mesmo, subverter a lógica de produção e distribuição pelo menos no âmbito da cultura, e caberia aqui especular sobre as possíveis consequências estruturais da nova conjuntura digital das sociedades em rede, da cultura colaborativa, da radicalização da democratização da informação e bla bla bla...

Mas olhando de perto o que está acontecendo agora nesse país, o mínimo que deveríamos perceber é que se uma lei viabiliza a produção, deveria viabilizar também o acesso democrático ao produto e à experiência desse produto. Do contrário eu prefiro a minha escola e o meu saneamento básico (de verdade, não o filme). Ou é público, com fins públicos reais, ou deixe o mercado cuidar disso sozinho e ele que se acerte com o povão, com a pirataria, com o P2P etc, na moral...

P.S. Cá pra nós, uma fotografia de minha autoria foi, digamos, alocada sem minha autorização, para a capa dos convites de formatura de uma turma de comunicação. A imagem não foi creditada e duvido que alguém tenha sabido que era minha. Eu nem sequer recebi um convite, mas mesmo assim fiquei intimamente (e silenciosamente) orgulhoso. Sacaram?:)))

Abraços!

Nenhum comentário: